domingo, 23 de setembro de 2007

Estranho Prazer

Ela sentiu aquele olhar intenso invadir seus sentidos. Os olhos de tempestade dele mergulhavam em sua alma. Sentia-se tremer como uma menininha. Respirou fundo, e ergueu o queixo levemente, em desafio. Ele era alto... Mas ela não se deixaria dominar, ou, sabia, estaria perdida.

Outrora sentira prazer nesse tipo de situação. Um olha penetrante, seco, que rasga a alma... Já fora prazeroso e engraçado, mas não nesse momento. Agora tinha medo. Receio talvez fosse a palavra ideal. Mas ela não seria dominada tão facilmente... Não dessa vez.

Seus olhos, negros. Piscou com graça os cílios longos. A boca, carnuda, vermelha, sensual, curvou-se em um sorriso provocante. Sentia-se dona de seus atos novamente. Sentia-se a Rainha daquela relação de dominação. E por um curto lapso de segundo ela, pequenina, na ponta dos pés, ergueu o queixo não em desafio - mas na ânsia de olhar mais profundamente naqueles olhos argênteos.

E sua reação o assustou... O passo atrás que dera, apenas mostrava isso a ela. Finalmente estava na situação que desejava. Dona de si. De presa à caçadora. Não entendia os homens. Frágeis, todos... E mesmo aquele que gelaria a espinha de qualquer uma, agora não passava de apenas mais um... Como todos...

“Homens...”

Deslizou a ponta do indicador sobre aqueles lábios, umedecendo os próprios com a ponta da língua. Ele havia jogado com o coração dela, desdenhado de seu afeto mais de uma vez. Mas agora ele estava ali, ao alcance de suas mãos, de seus lábios, de seu afeto. Mas este sentimento agora estava morto em seu peito.

Felizmente aquele jogador não sabia disso. E o blefe, é o que fere os de seu tipo... Acham que estão a ganhar, e, quando apostam todas as suas fichas, perdem o que tem, e o que não tem... Nesse caso, jogava-se com emoções, não sentimentos... Aproximou-se lentamente de sua boca, quase tocando seus lábios com os dele, e sussurrou algumas palavras...

- Você...

Ele tremeu levemente sob seu toque. Ele caiu. Caiu. Um abismo escuro, tépido. Ela sorriu de encontro aos lábios dele. E selou a perdição de ambos com um beijo lascivo.

Divertia-se com a cena. Um demônio de saias... Era isso o que era, a encarnação da própria Lilith... Mas não vingava-se, apenas divertia-se. Sabia que aquilo logo teria fim, e teve sua prova quando sentiu uma mordida em seu pescoço. Ele voltava com força, e com a fúria típica dos machos, em seus olhos.

A fisgada de dor encheu seus sentidos de um prazer avassalador. Aquele momento, efêmero como todos, logo passaria. Mas, por hora, ela só queria aproveitar. No dia seguinte se culparia, choraria, amaldiçoaria o mundo e a si mesma pela vingança que na verdade a feria mais que a ele. Não era uma vingança, mal admitia para si mesma. Ela o desejava como antes, mas dizer isso era condenar-se diante do mais cruel dos Juízes.

Consciência... Não precisava de seu Grilo Falante agora. O momento estava em suas mãos, e se entregou sem importar-se com o amanhã. Sempre fora assim, não havia porque agir diferente agora. Ele sempre a tivera quando quisera, e ela sempre desejou isso...

Os braços que a envolviam com força a puxavam contra aquele corpo - um corpo tão diferente do dela própria. O cheiro da pele dele inebriou totalmente seus sentidos, e ela sentiu-se ceder quando ele sussurrou qualquer coisa ao seu ouvido. O que teria sido mesmo? Não sabia dizer. Mas estava de volta a posição de caça. Uma presa indefesa que se deleitava em servir a seu caçador.

Daria seu sangue por ele, e sabia que ele o tomaria pra si. Almofadas? Uma poltrona? Não sabia nem onde estava mais. Espaço e Tempo agora apenas constavam em uma estranha teoria de um físico maluco. Chegava ser saborosa a dor por ter os cabelos puxados. Era assim que ele chegava mais facilmente àquele que parecia ser seu objeto mais precioso. Não eram seus lábios, nem outra parte de seu corpo... Era ao pescoço que ele insistentemente buscava...

Ela arqueou o corpo, oferecendo-se para a consumação da ansiedade dele. Adorava ser sua escrava. A fisgada de dor, mais intensa, e o veio vermelho, quente, a escorrer por sua pele, diziam tudo - ele gemeu de extâse, ela o prendeu entre suas pernas. Ela o odiava mais que tudo no mundo, odiava o modo como a fazia sentir. Odiava sentir prazer em ser subjugada por ele... um prazer insano, intenso.

Talvez isso fosse amor... Sim... Tantas mentes e tanto esforço para entender uma simples palavra, e ela estava ali, definida como o seu maior antônimo. Ela amava aquele ser por odiá-lo tanto. Um último suspiro, e ele consumava seu ato. Talvez ele pensasse que apenas ele sentia prazer com aquilo, ao ver como deixara suas roupas rasgadas e seu ser jogado sobre aquela cama... Sim, uma cama e não almofadas ou sofás... Enganava-se... Era ela quem sentia o maior prazer. Não havia dúvidas.

Sorriu para ele, e acariciou seu rosto odiado. O amor escorria de seu rosto para se transformar em escuridão. Os olhos negros dela reluziam o abismo do amor que sentia por aquele ser dominador, por seu Mestre. Ela sorriu, doce e entregue. Sussurrou palavras de amor eterno.

E como sempre ele virou-se e sumiu por aquela mesma porta, deixando-a deitada e estirada em sua cama, sem nem ao menos olhar para trás, ou perder alguns segundos para lhe dizer algumas palavras de conforto. Nem ao menos um cigarro.

Colaba e Lorien

Nenhum comentário: